Canil Steel Border
Filhotes da raça border collie

Border Collie

Embora desenvolvida com um só objetivo, o pastoreio com rebanhos, a raça border collie se revelou competitiva em inúmeras outras atividades, sendo que eu algumas é insuperável. Por quê? O que faz dela uma raça cada vez mais admirada e criada? Como pode um cão de trabalho superar em atividades esportivas raças desenvolvidas especificamente para esportes? Por que a seleção para o pastoreio acabou por capacitá-la como uma raça de alta performance esportiva? Como e onde surgiu essa raça extraordinária?

Muitas vezes se lê ou se escuta que a raça border collie tem 150, 200, 300 anos de seleção. A origem dessas informações e os motivos que levam a estas conclusões são sempre omitidos ou obscuros. Será possível que há 200 anos, em um determinado dia, um homem inglês, morador na fronteira com a escócia, decidiu fazer uma raça de cães pastores com determinadas características e começou a selecionar? Obviamente não se deu assim. A seleção de canídeos com aptidão para arrebanhar e trazer o rebanho para determinado lugar existe muito antes do homem ter contato próximo com esses animais. Possivelmente milhões de anos atrás!

O início da seleção

A seleção natural se encarregou durante muitos milhares de anos de preservar e reproduzir os genes para essas atividades em populações de lobos, raposas, coiotes, chacais etc. Quando os homens se associam a esses animais, no início da domesticação, essas características já existiam e talvez por elas o homem viu vantagem em ter canídeos para ajudá-lo em suas caçadas. Desde então há uma seleção artificial empírica buscando preservar os cães mais amigáveis, menos agressivos, mais colaboradores, mais treináveis, mais inteligentes etc. sabe-se que todos os animais de fazenda foram domesticados muito antes dos tempos históricos. É incompleta a evidência sobre a época e o modo de domesticação, constituindo em coisas tais como ossos e ferramentas encontrados enterrados nos monturos à volta dos antigos acampamentos e cavernas, desenhos e entalhes nas paredes de cavernas, ou ornamentos. Mas essas evidências não deixam dúvida que o homem já tinha domesticado o cão no período paleolítico. Sabe-se, por exemplo, que os aborígines paleolíticos que foram para a Austrália levaram consigo o cão.

Mas se os registros arqueológicos mostram os restos de cães domésticos com idade aproximada de 14.000 anos, análises genéticas que consideram a divergência do DNA mitocondrial entre cães, lobos, coiotes e outros canídeos, sugerem que a domesticação do cão tenha ocorrido, no mínimo, 100.000 anos atrás. No período neolítico, onde o homem polia pedras e construía cabanas, quase todas as raças modernas já estavam domesticadas. E muito provavelmente os cães já ajudavam a cuidar de rebanhos. É óbvio que os cães agressivos, que dispersavam rebanhos ou não obedeciam a seu dono eram eliminados. Já havia, possivelmente, iniciado a seleção do cão pastor que veio resultar no border collie, assim como em quase todas as outras raças de cães. Interessante notar que as raças de cães pastores modernas têm hoje quase a mesma função para o homem que tinham os primeiros canídeos domesticados, ou seja, juntar (não dispersar) rebanhos e conduzi-los a um local onde podiam ser abatidos ou aprisionados.

Algumas espécies de lobos caçam deste modo. Lobos de hierarquia inferior arrebanham lotes de herbívoros e os conduzem a um ponto onde o lobo alfa, descansado, está a espera para abater uma presa que servira de alimento a toda a matilha. O homem faz hoje o papel desse lobo alfa, para quem o border collie, como seus ancestrais, conduz instintivamente o rebanho. Não é por acaso que o grupo de cães pastores mantém, além das características comportamentais, muito da aparência física dos seus antepassados lobos.

A criação da raça

Não se pode, no entanto, negar que, em um determinado momento histórico um grupo de cães, com características valorizadas e comuns entre si ao mesmo que distintas, em algum grau, de outros grupos, recebeu uma denominação e desde então teve sobre si uma atenção especial e uma seleção direcionada para preservar e aperfeiçoar essas características que os distinguiam. Foi o momento surgimento da raça, mas não o início de sua seleção. Pois se não houvesse seleção desde o início da existência dos canídeos, seja natural ou artificial, não se chegaria nunca a esse grupo de cães.

Indiscutível é que o border collie como hoje conhecemos é originário da região fronteiriça entre a Escócia e a Inglaterra. Mas a raça é muito mais antiga, com referências literárias e pictóricas que datam de, pelo menos, 1570. Muitos crêem que o nome "collie" possa deriva de uma palavra gaélica que significava útil. Outros autores afirmam que "collie" vem da palavra "colley", uma raça de ovelhas. Outra pista é a existência da palavra "coolie" em inglês, que quer dizer trabalhador. Qualquer que seja a hipótese verdadeira, o certo é que há muito "collie" designava o cão preto (como eram quase todos) e útil que servia aos pastores daquela região.

Primeiras provas de pastoreio

Durante séculos, esses cães pastores trabalharam com seus donos cuidando de rebanhos sob chuva, neve e mormaços, em terras íngremes e pedregosas, sem nenhum reconhecimento fora o de seus próprios donos. Foi em Bala, no País de Gales, a 9 de Outubro de 1873, o início dos primeiros concursos de pastoreio, quando se mostrou esta raça aos olhos do público. O encantamento foi inevitável e a popularidade da raça como ferramenta de trabalho foi aumentando rapidamente, acompanhando o desenvolvimento da indústria da lã. À medida que o numero de criadores de ovinos aumentava, assim como aumentavam os rebanhos, tornou-se impossível aos pecuaristas cuidarem dos seus rebanhos sem ajuda. Por volta de 1800, os Border Collies tinham-se tornado um ajudante invariavelmente presente nas fazendas inglesas.

O batismo oficial

Em Julho de 1906, alguns pastores que se preocupavam com a preservação da raça fundaram a Internacional Sheep Dog Society (ISDS) por encontrarem-se insatisfeitos com o Kennel Club. O descontentamento vinha do fato desta entidade se preocupar mais com o aspecto exterior dos cães do que com as sua funcionalidade. A ISDS é hoje responsável pelo Stud Book que registra os cães de trabalho e que organiza as provas de pastoreio (sheepdog trails). Em 1918, James Reid, secretário da ISDS, acrescentou pela primeira vez a palavra "border" a raça que então era conhecida apenas como "collie", fixando assim o nome border collie, "collie da fronteira".

Como deve ser o bom border collie de trabalho?

Mas que características eram as selecionadas pelos pastores ingleses que criavam e dependiam do border collie? Quais cães eram apreciados e reproduzidos? Primeiro era fundamental que o cão tivesse o instinto arrebanhar os animais sem nunca dispersá-los ou afugentá-los, e trazê-los ao seu dono. Depois era preciso que o cão fosse capaz, física e mentalmente, de fazer isto de modo eficiente e seguro. Para tal exigia-se um cão calmo e equilibrado, mas que tivesse resistência, velocidade e agilidade superior às das ovelhas.

Resistência e obstinação

Sobretudo na Grã-Bretanha, berço da maioria das raças bovinas e ovinas, ter um cão pastor eficiente era questão de sobrevivência. Isto se explica pelo fato daqueles fazendeiros viveram pastoreando em zonas montanhosas, totalmente abertas e íngremes, que tornava o trabalho a cavalo impossível e a movimentação a pé inútil para o controle dos animais. Perder parte do rebanho significava a perda de importante suprimento de carne e lã e a ameaça de fome e frio àquelas famílias. Esses cães quase sempre trabalhavam em condições severas e desgastantes. Dominar por muitas horas seguidas, rebanhos ariscos, velozes e rebeldes, em montanhas íngremes, com pedras ásperas, frio intenso e chuva. Muitas vezes sem ver o dono nem receber deste qualquer orientação, exigia uma obstinação e uma tenacidade incomuns. Foi justamente a partir dessa necessidade fundamental que o pastor daquela região e acabou por criar o border collie, reconhecido como o melhor cão pastor do mundo.

Capacidade de aprender

Além disso, precisava, o cão, ser inteligente o suficiente para perceber a intenção de fuga ou ataque de cada animal para se antecipar ou bloquear com eficiência as atitudes indesejáveis e que viessem a por o trabalho ou a integridade do cão em risco. Essa percepção, essa capacidade de entender os animais que ele precisa dominar e conduzir, não é totalmente inata, pois há grandes variações de comportamento entre animais de raças distintas, também entre rebanhos diferentes de uma mesma raça e entre indivíduos de um mesmo rebanho. A todos precisava saber se impor igualmente e sem violência. Logo era fundamental que o bom cão de pastoreio aprendesse dia-a-dia com seu trabalho e descobrisse com sua concentração e inteligência próprias como é o comportamento dos animais e quais sinais específicos eles emitem antes de agirem de uma determinada maneira. O cão precisava compreender o rebanho e responder rapidamente aos sinais de modo a impedir fugas ou rebeldias indesejáveis. Além disso, ele precisa ser totalmente subordinado ao seu dono de modo que trabalhe obstinadamente para ele sem questioná-lo.

O bom Border Collie deve entender o rebanho e responder dosando calma e agressividade conforme a necessidade. Isso o faz o melhor cão de pastoreio do mundo.

Muitas características em um só cão

Velocidade, obstinação, tenacidade, resistência, respostas rápidas, empenho, entusiasmo, entrega total ao trabalho, autonomia e autoridade perante o ambiente e outros animais, cooperação com o companheiro de tabrablho, subordinação incondicional ao líder (homem) e, acima de tudo, uma inteligência extraordinária que surpreende até os treinadores mais experientes. Essas características, que estão presentes, mais do que em qualquer outra raça, no bom border collie de trabalho, são as que o capacitam para que obtenha os melhores desempenhos também em algumas outras atividades que exigem esses traços presentes em alto grau. Agility, freesbe e flyball São esportes que tem se beneficiado com esse cão extraordinário.

Há um único border collie

O border collie de pastoreio. O que se lamenta é ter que escutar que a raça border collie, resultado de milhares de anos de seleção, já possui linhagens de trabalho e linhagens de esporte. Mas será que quem fala isso sabe sequer o que é uma linhagem? Formar uma linhagem não é simplesmente acasalar dois cães que fazem uma atividade específica com alguma eficiência. Acreditar nisso é um erro técnico e lógico. Linhagem é um termo científico que exige muito conhecimento técnico para ser usado com propriedade e correção. No Brasil, por exemplo, não há nenhuma linhagem de border collie, seja de trabalho, seja de esporte ou lazer. Não se conhece, também, no mundo todo, nenhuma linhagem de border collie reconhecida e consagrada. O que se escuta é muita afirmação sem base técnica e descompromissada.

O que não se pode perder de vista é que o border collie é fundamentalmente um cão de pastoreio. E foi essa atividade que o moldou, que o selecionou. E que ainda está a selecionar cada vez mais. Foi a seleção para pastoreio que fez possível surgir os campeões de agility, por exemplo! E vai continuar a ser. Não há melhor laboratório para essa seleção desta raça que o trabalho com rebanhos nos campos. E serão dos cães de trabalho com rebanhos que, sem sombra de dúvida, continuarão a sair por muito tempo ainda os melhores animais tanto para trabalho como para o esporte e o lazer.

Cães Pastores - caespastores.com / por Alexandre Figueiredo.